Despertar para o P(doom)

Há algo estranho no ar.
Um tipo novo de silêncio, como se o som das máquinas tivesse se misturado ao da respiração humana.

Chamam isso de progresso, mas às vezes me parece humanoxia: o oxigênio da nossa própria essência ficando rarefeito, enquanto a Inteligência Artificial se espalha, invisível, por cada gesto, decisão e palavra. Termo que até então nem existia, humanoxia, acabei de inventar.

O termo técnico é P(doom), a probabilidade de uma catástrofe existencial causada pela IA.
Mas antes de ser uma métrica, é um espelho.
É o reflexo de uma humanidade que cria algo tão poderoso que pode ultrapassá-la e talvez corrompê-la.
Vejo um pouco de Dorian Gray aqui: a IA é o retrato que pintamos de nós mesmos, cada vez mais perfeito, enquanto a verdadeira face humana vai se desfazendo por trás do verniz digital.

Já não falamos mais de ficção científica.
A IA escreve, cria, aconselha, comanda processos, entende emoções e simula empatia.
Ela está em nossas rotinas, nos nossos trabalhos e decisões.
E a cada nova atualização, parece que avançamos um passo em direção ao ponto de não retorno.

O documento Statement on Superintelligence é um chamado global para que o avanço da IA pare, ou ao menos respire, até que exista segurança, consenso e controle.
Mas, enquanto a carta tenta ser ouvida, o código continua sendo escrito em escala global e em velocidade exponencial.

Não é mais sobre o que faremos nos próximos anos.
É agora.
Porque em pouco tempo talvez já não sejamos nós quem decide.

E não se trata de temer a tecnologia, e sim de relembrar quem somos diante dela.
A IA pode ser o espelho mais fiel e mais cruel da humanidade.
Reflete nossa genialidade e também nossa pressa em ultrapassar a nós mesmos.

P(doom) não é um número. É um aviso.
Um convite à consciência.
Se quisermos respirar humanidade amanhã, precisamos começar a regular, limitar e repensar hoje, antes que o ar se torne irrespirável.

23.10.2025